Como a preguiça de caminhar da
estação até nossa casa nos levou até a Valônia
Contrariando toda a ordem
cronológica do meu blog, vou começar os meus relatos pela volta de Maastricht. (Se
quer saber como foi à viagem, espere pelo post #MaastrichtPart1).
Vou começar pela nossa espera pelo último
ônibus de volta pra Hasselt. Depois de perder o ônibus das 18h e de uma grata
surpresa pelo atraso (no próximo post saberás do que estou falando), fomos para
o ponto esperar sentadas por 30 min. Ok, pelo menos estávamos sentadas (By the
way, eu estava com a Laís!). Até que me aparece um sujeito estranho, que senta
do meu lado e começa a falar com a gente. Não entendemos nada. Aí ele diz: “You
don’t speak English” “Yes, we do” (ele que parecia não conseguir falar nada
direito). Papo vai, papo vem, ele disse que também estava indo pra Hasselt, que
morava lá, acho que falou alguma coisa do frio, que não gostava de ônibus, que
não gostava de esperar... e mais um
monte que não entendemos. E eis que, de repente, puxa um cigarro. De maconha,
claro. “You don’t smoke?” “No” “Oh, you are like... how do you say, the opposite
of sick (…). You don’t smoke,
you don’t drink, you don’t fuck”. A
Laís, bem ao estilo tipo 8, vai e diz “Yes, we study”. Ele ficou quieto do lado
dele, fumando, e nós saímos de perto, esperando o ônibus.
Aí a gente pensa, né: já temos
uma história pra contar! Que nada... o melhor ainda estava por vir! Chegamos na
estação de Hasselt, olhamos para os horários de trem e vimos um pra Bruges...
saindo em dois minutos. Correria pra pegar o trem... e conseguimos. Laís
encantada com o trem de dois andares, chique. No meio da viagem, sobem uns
bêbados e do nada começa a tocar uma música alta. Laís diz: “E eu que achei que
esse tipo de coisa só acontecia no Brasil”. Não minha cara, Laís, gente sem
noção existe em todo lugar.
Mas essa foi a parte normal da
viagem. Chegamos na estação de Leuven e quem disse que a gente teve coragem de
sair na andando na chuva até nossa casa? “Vamos de ônibus?” “Mas você sabe
qual, Gabi” “Eu tirei uma foto do ponto perto de casa! (menina esperta). Todos
esses passam”. Incluindo o 337, que foi o que pegamos.
Todos os ônibus que passam perto de casa.
O primeiro esboço de reação assustada
da Laís veio logo quando o ônibus saiu da estação e não virou na
Bondgenotenlaan. “Ah, ele deve seguir pelo anel”. E seguiu. Chegando no sinal
da Naamse poort, a Laís vira e diz: “Nó, imagina se ele vira à esquerda aqui”.
Oh boca maldita!! “Será que a gente desce?” “Ah, ele deve passar por Heverlee e
voltar” “Ah, então tá bom”. E como a gente não estava com pressa, não nos
importamos. E o ônibus seguiu em frente. Em frente. Em frente. E não virava pra
trás. E eu só via a cara de preocupada da Laís. O ônibus ia ficando vazio... E
lá vem a Laís: “Imagina se a gente vai parar em outra cidade”. Boca maldita
2!!! Saímos dos domínios de Heverlee. Mas ok, ainda estávamos no Oud-Heverlee.
Só que as casas começaram a desaparecer. Estávamos nas estradas belgas em
regiões inabitadas (meaning: um conjuntinho de casas a cada quilômetro). “Gabi,
você não acha melhor perguntar pro motorista?” E lá vai a Gabi...
“Excuse-me, I think we took the bus
in the wrong direction... is it going back to Leuven?” “Yes, I’ll go back” “Oh,
great, thank you”. “Wait, where were you supposed to go to?” “Minderbrodersstraat,
close to the botanic garden”. Ele só balança a cabeça… e na minha cabeça só vem
“shit”. “But ok, we’ll go back
to Leuven”. Contei as novidades pra Laís (menos a balançada de cabeça,
senão ela ia ficar um pouco mais preocupada) e completo: “Simpático, o senhor
do ônibus”. A Laís olha para o retrovisor e diz: “Ele tem cara de psicopata” “Oi?
É um velhinho tão bonzinho!” “Gabi, olha a cara de pagodeiro que ele tem!”.
Hehe!!!
Daí pra frente, ficamos olhando a
paisagem. “Ah, já deve estar voltando”. Não, estava chegando em outra cidade:
Huldenberg. “Laís, come um chocolate!” - Eu e minha tentativa de desviar a
atenção dela do caminho. “Agora estamos chegando ao ponto final”. Acho que falei
isso umas 5 vezes pelo caminho! Enquanto isso, passamos por mais umas cidades,
Sint... e enfim chegamos em Wavre – ponto final do ônibus. Claro que já não
tinha mais ninguém no ônibus. Daí o motorista pega um cigarro, joga a ponta do
cachecol ao redor do pescoço e pergundo: “How did you end up here?”. Aí contei
pra ele que peguei o ônibus na direção errada e tal. “Oh, and you just came to Valonia”. Minha cara
de assustada: “What?? We are in the south?? Oh, yeah, it’s written in French!”.
Sim, a nossa preguiça fez a gente parar na Valônia! Mas como o nosso amigo disse, “you are Lucky,
because I have to go back to Leuven”. E explicou pra gente os percursos
que ainda faria naquela noite. Aliás, contou a vida inteira pra gente. Que
tinha uma propriedade no sul da França (#brunetteaprova), que antes tinha uma
printshop, mas que alguma coisa deu errado, e que ele virou motorista de
ônibus, mas que só trabalhava nos finais de semana, incluindo o nightbus, que
roda nas sextas e sábados... contou que o patrão era amigo dele da época da
printshop, então que quando ele queria ele ia pra França... e que esse era o
último final de semana que ele trabalhava no ônibus aqui na Bélgica: vai entrar
de férias até o ano que vem e em agosto vai largar o trabalho e ir pra França,
onde vai abrir um restaurante. E falou que sai da Bélgica na quarta-feira,
depois de visitar o filho dele no hospital. Ele tem 3 filhos e se separou da
mulher há 5 anos, mas tem uma boa relação com ela (pelo que eu entendi, ela que
o largou). E pretende continuar sozinho. Segundo ele, morar sozinho também tem
os seus pontos positivos: pode sair do serviço e ir tomar uma cerveja, pois não
tem ninguém esperando por ele. E pra ele, chega de relacionamentos: é difícil e
ele sofre muito.
Sério, a simpatia e honestidade
dele me ganharam fácil. A Laís, apesar de ter achado que ele era até simpático,
ainda ficou com o pé atrás. Falamos pra ele que tínhamos ultrapassado o limite
da cidade e que devíamos pagar pela passagem e ele diz: “I’m not supposed to
smoke in the bus. You don’t need to pay”. =)
De volta à estrada, a preocupação
da Laís passou um pouco. Mas eu continuei oferecendo chocolate. E ele olhava
com aquela cara de assustada toda vez que ele fazia um caminho que ela achava
que não era o mesmo da ida. “Calma, Laís. Tem o desvio ali” “Eu sou desconfiada”.
É, percebi. Essa é mesmo mineira.
Pulando alguns bons minutos da
viagem, chego enfim ao momento em que reconhecemos Heverlee. Nosso amigo, pouco depois, vira e diz pra gente
“Let me know where you want to go, we are close to the Botanic Garden”. “Opa!
Ele vai deixar a gente onde a gente quiser!” E deixou a gente bem perto de
casa. Na saída, eu super simpática, desejei boa sorte no novo empreendimento! E
falei pra Laís: “Você nunca mais pega ônibus comigo, né?" Já é a segunda vez que
vamos parar em lugares estranhos (a primeira vez a gente queria ir pro centro
e chegou na estação, mas tomamos um susto porque ele passou pelo anel). E ela
só ria...
Moral da história: Nunca pegue um
ônibus desconhecido comigo, mesmo que eu diga que sei onde ele vai parar!
A rota que fizemos (Estávamos em A e queríamos chegar no ponto azul)
A rota oficial do 337. Provando que a culpa não foi minha!
Em minha defesa: o ônibus para sim
no ponto perto da nossa casa, mas há um desvio por causa das eternas obras na
cidade. It was just bad luck.